Desembargadora vira ré por envolvimento em esquema de venda de decisão judicial
13/05/2023 - 09:29 | Atualizada em 16/05/2023 - 07:21
Redação
Foto: TJBA
Por unanimidade, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recebeu na última quinta-feira (11) denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) contra a desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) Maria da Graça Osório Pimentel Leal e manteve o afastamento cautelar de suas funções naquela Corte de Justiça.
Ela passa a ser ré na Ação Penal (APN) 965. Também foram denunciados Adailton Maturino dos Santos, Geciane Souza Maturino dos Santos, Dirceu di Domenico e Karla Janayna Leal Vieira. Eles são acusados de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa.
A ação é desdobramento da Operação Faroeste, que revelou a existência de uma organização criminosa no TJBA, entre 2013 e 2019, do qual faziam parte desembargadores, juízes, advogados e proprietários de terra. O esquema envolveu a venda de sentenças e outros crimes que tinham como propósito permitir a grilagem de terras no oeste da Bahia. O grupo criminoso atuava em quatro núcleos. O judicial, operado por desembargadores, magistrados e servidores do TJBA; o núcleo causídico, que contava com a intermediação de advogados; o econômico, do qual faziam parte produtores rurais e; por fim, o núcleo de defesa social, cuja missão era dar blindagem aos demais núcleos.
Em sustentação oral, a subprocuradora-geral da República Ana Borges Coelho Santos explicou que os mentores do esquema foram Adailton Maturino, que usou o borracheiro José Valter Dias como laranja para convalidar registros de imóveis em seu nome. Numa irreal composição patrimonial, o borracheiro se transformou em grande latifundiário, dono de cerca de 360 mil hectares de terras, estimados em R$ 1 bilhão em valores atuais. Ela explicou que o plano de Maturino só foi possível com a cooptação de magistrados do TJBA, destacando-se a desembargadora Maria da Graça Osório.
O esquema
A denúncia narra o contexto em que ocorreu a venda de uma dessas decisões e a lavagem do dinheiro obtido com a atuação criminosa. Essa decisão teve como gênese a pretensa regularização de uma área de 43 mil hectares, próximo à divisa com o Piauí, em nome do borracheiro José Valter e de sua esposa. O objetivo era desmembrar o imóvel rural e negociar as frações para auferir ganhos espúrios. O processo consistiu em uma suscitação de dúvida pelo delegatário do cartório de Formosa do Rio Preto, na Bahia, o qual questionou a possibilidade de desmembramento da matrícula da área. O Juízo de primeiro grau concluiu pela impossibilidade do fracionamento, no entanto, ao receber o recurso de apelação interposto contra a sentença, a desembargadora Maria da Graça Osório proferiu liminar, em 4 de setembro de 2013, determinando a abertura de 17 matrículas em caráter precário.
O pagamento da propina era feito por Adailton e Geciane Maturino, que sacavam valores e entregavam o dinheiro em espécie a Karla Janayna Leal Vieira, sobrinha de Maria da Graça Osório, e operadora financeira do esquema. Era ela quem, logo em seguida, depositava o recurso em sua própria conta. “Entre 14 de agosto de 2013 e 18 de fevereiro de 2019, foram identificados ao menos 53 saques das contas de Adailton Maturino e Geciane Maturino, e depósitos na conta de Karla Janayna, que atingiram R$ 271 mil”, afirmou Ana Borges Coelho Santos. As vantagens indevidas também eram recebidas por meio do custeio de contas pessoais e de pagamentos de jantares e ingressos para eventos artísticos.
Um dos braços financeiros da organização era o agricultor Dirceu di Domenico. Ele tinha interesse na decisão negociada, pois passaria da condição de arrendatário para real proprietário de imóvel rural. As investigações revelaram que ele fez um saque milionário na data que tramitava o recurso de apelação, além de ter feito diversos pagamentos a Adailton e Geciane, e várias transferências para uma empresa pertencente aos dois, utilizada para movimentar o dinheiro ilícito.
Lavagem de dinheiro
De acordo com a denúncia do MPF, Maria da Graça Osório, no exercício do cargo de desembargadora do TJBA, com auxílio de sua sobrinha e operadora Karla Janayna, Adailton Maturino e Geciane Maturino, no período entre 1º de janeiro de 2013 e 27 de fevereiro de 2019, tendo como propósito distanciar o dinheiro derivado de crimes de sua origem ilícita, ocultou e dissimulou a origem, a natureza, a disposição, a movimentação e a propriedade de ao menos R$ 662,5 mil. Nesse período, Maria da Graça Osório movimentou mais de R$ 13 milhões em 57 contas bancárias, sendo que apenas 22% do valor advinham de seus proventos e salários. (Informações do MPF)