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A cada 3 dias, surge uma nova TelexFREE, diz procuradora

29/07/2013 - 08:49

Marcos Prates Da Exame

 Faz um mês e meio que um bom número de brasileiros está com ressentimento do trabalho do Ministério Público. Por ações de procuradores e promotores, 200 mil vendedores da BBom e estimados 450 mil da TelexFREE estão proibidos de receber o que as empresas lhe devem. As duas tiveram os bens bloqueados na justiça acusadas de praticar pirâmide financeira.

“No curto prazo, a pessoa leva um susto e fica com raiva. Mas assim ainda tem chance de receber o dinheiro de volta. Se esperássemos (as empresas quebrarem), não iriam receber nada”, defende a procuradora da República de Goiás, Mariane Mello.

Há 20 anos no Ministério Público, Mariane é uma das responsáveis pela ação que paralisou neste mês os serviços da Bbom, empresa de venda de rastreadores veiculares.

A procuradora integra uma força tarefa criada há menos de três meses pelo MP, a nível nacional, para dar conta de um crime que, segundo ela, encontra novos representantes a cada três dias: a pirâmide.

No momento, 30 investigações estão em andamento pelo grupo. As empresas alegam praticar marketing multinível.

Em entrevista à EXAME.com, Mariane não tem dúvidas do estrago que golpes financeiros podem trazer para milhares de pessoas.

“Para quem está em cima ganhar, os que estão embaixo – muitos – têm que perder”, atesta.

EXAME.com – O crime de pirâmide financeira está crescendo no Brasil?
Mariane Mello -
 Está crescendo exponencialmente por causa das redes sociais. Hoje o poder de proliferação de uma empresa dessas é impressionante. Nasce hoje e amanhã está no Brasil inteiro. A cada 3 dias, surge uma nova.

EXAME.com – E como o Ministério Público vem atuando para dar conta desse aumento?
Mariane -
 Nós temos uma força-tarefa criada para combater nacionalmente esse boom de pirâmide financeira. No momento, estamos investigando 30. Temos como prática só nominar as investigadas depois que entramos com o processo e conseguimos o bloqueio dos bens. Se nomeássemos antes, poderíamos frustrar os valores de bloqueio. Além disso, no curso da investigação, podemos chegar à conclusão que uma ou outra não é pirâmide. Por isso temos tomado o cuidado de só divulgar aquelas com ações em curso. No momento, existem só duas, TelexFREE e Bbom. Mas a força-tarefa está em estágio avançado e novos nomes podem ser acionados judicialmente no mês de agosto.

EXAME.com – Os vendedores das empresas bloqueadas têm feito protestos pelo país contra as decisões da justiça, pois estão sem poder trabalhar ou receber. Eles acreditam que o trabalho do MP não é a favor deles?
Mariane -
 O que o Ministério Público esta fazendo é proteger os consumidores. Eu acho que, no curto prazo, a pessoa leva um susto e fica com raiva. Até os recursos voltarem, vai demorar pelo menos dois anos. Mas quando a pessoa vai percebendo que entrou numa armadilha, ela muda. Ela ainda tem chance de receber o dinheiro de volta. Se esperássemos, não iriam receber nada. Quem entra no início de fato ganha dinheiro, mas esses são minoria. São eles que aparecem dirigindo Ferraris e Lamborguinis no Facebook, vendendo a ideia de que todo mundo vai chegar lá. É uma falácia. A grande maioria vai bancar esta conta. Para quem está em cima ganhar, os que estão embaixo – muitos – tem que perder.

EXAME.com – Como a pessoa pode se precaver contra esse esquema ilegal de ganhar dinheiro?
Mariane -
 O consumidor tem que ficar atento para não aceitar proposta de ganhos fáceis e rápidos. É interessante que consumidor, antes de adquirir pacotes, procure os Procons e o MP. Nós ainda temos condições de prevenir. Depois que ele está dentro, se a empresa quebrar, não vai receber nunca. Se tiver bloqueio, conseguimos devolver a quantidade bloqueada, o que nem sempre é 100% do que o consumidor investiu.

EXAME.com – Ele não recupera o dinheiro todo?
Mariane -
 É preciso pegar e empresa quando ela está crescendo. Normalmente, elas têm fase rápida de maturação, depois de 1,5 ano não se encontra mais ninguém. Aí ainda você consegue recuperar. Mas no caso da BBom (bloqueio de 300 milhões de reais), por exemplo, não vai ser suficiente. Gastaram com carros de luxo e propaganda. De qualquer maneira, vai ser suficiente para pagar uma grande quantidade de consumidores. Só que tem consumidor que não guardou comprovação dos negócios e não tem como provar. Vamos tentar pegar a relação com a própria empresa.

EXAME.com – Que tipos de documentos precisam ser guardados?
Mariane - 
Todos os comprovantes, depósitos feitos, e-mails trocados, cópia de cheques, recibos e contratos. Num momento oportuno, esses consumidores vão precisar juntar os autos dessa documentação para poder pegar o dinheiro de volta. Só será possível na medida do que a pessoa investiu, não dos lucros prometidos.

EXAME.com – Quais as maiores evidências de que uma empresa pratica pirâmide?
Mariane -
 Primeira delas: uma empresa seria de marketing multinível não promete enriquecer pessoas do dia para o outro. Quando se oferece a chance da pessoa triplicar o capital em um ou dois meses, a chance de ser pirâmide é muito grande. A empresa de marketing multinível séria ganha dinheiro tanto com recrutamento de vendedores quanto com a venda de produtos. Mas nestas, o foco é o produto. Ela treina seus vendedores para que conheçam profundamente o produto que vendem. Há um investimento grande no produto em si, que está sendo sempre melhorado. Na pirâmide, o produto é o menos importante. O vendedor é treinado para dizer o quanto uma pessoa vai ganhar se entrar no esquema.

EXAME.com – Os casos que já foram acionados pelo MP, BBom e TelexFREE, se encaixam nesse perfil?
Mariane - 
No caso do TelexFREE, muitos divulgadores nem sabem para que serve o VOIP (serviço de telefonia via internet oferecido pela empresa), e quem sabe também sabe que você consegue aplicativos de graça na internet, enquanto eles cobram 50 dólares. O produto é pouco competitivo, pouco atraente, porque não é o foco da empresa. No caso da BBom, os rastreadores eram oferecidos por 80 reais por mês. Só que, além disso, era preciso pagar adesão de 60 reais e um plano que ia de 600 a 3 mil reais. No site Reclame Aqui, localizamos 1,2 mil pessoas que se associaram e não adquiriram os rastreadores. O patrimônio da BBom cresceu mais de 3 mil por cento em menos de seis meses, foi de 100 mil para 300 milhões. Um crescimento exponencial para um produto não competitivo.

EXAME.com – As penas para quem pratica pirâmide financeira são suficientes hoje?
Mariane -
 A pena é muito baixa. Nós da força tarefa do MP queremos sensibilizar o poder Legislativo para que ele as reveja para cima. A pena hoje é de seis meses a dois anos de prisão pelo Código Penal, muito pequena para a gravidade do crime. No âmbito cível, a gente pode fechar as empresas e bloquear os bens.

EXAME.com – Se depender do Ministério Público, como acaba essa história no Brasil?
Mariane -
 Nos EUA, por volta de 1999, existiu uma quantidade muito grande de pirâmides, com mais de 600 casos. E lá houve também um recrudescimento, um combate muito sério pelo MP americano e judiciário. Nossa esperança com a força-tarefa e a divulgação por parte da imprensa é que haja conscientização social para que o consumidor aprenda a distinguir o joio do trigo. Quando os golpistas perceberem que não há retorno no mercado, a tendência é desistir disso. A ideia da força-tarefa é, através da legislação, fazer com que o Brasil não seja mais atraente, tal qual aconteceu nos EUA, onde 90% das empresas atuam com marketing multinível. Aqui, são só 10%. Só que lá tem uma associação que fiscaliza, enquanto aqui estamos engatinhando neste tipo de trabalho. O Brasil ainda está aprendendo a operar empresas multinível. E esta pirâmide acaba atrapalhando as que são sérias.

 

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