A percepção de risco dos investidores internacionais piorou de forma mais intensa com o Brasil do que com o conjunto das economias da América Latina. Desde o início do ano, o risco-país brasileiro medido em CDS (Credit Default Swap) subiu 87 pontos, para o patamar de 290 pontos, de acordo com um monitoramento realizado pela consultoria Tendências. Nesse mesmo período, a média do risco-país da Colômbia, Chile, Peru e México avançou 58 pontos, para 168 pontos. As informações são do G1.

O CDS é uma espécie de seguro contra calote e, portanto, funciona como uma das principais medições de riscos entre as economias. Quanto mais alto é o CDS, mais arriscado o país é considerado pelos investidores.

"O pano de fundo desse movimento é o momento mais adverso e desafiador do mundo", afirma Silvio Campos Neto, economista da Tendências. "O ajuste monetário tem sido mais incisivo do que o esperado, com o Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA) tentando tomar as rédeas da inflação."

Na semana passada, o Federal Reserve subiu as taxas de juros do país em 0,75 ponto percentual – o maior aumento realizado desde 1994 – numa tentativa de cortar a maior inflação do país em 40 anos.

Juros mais altos tiram o ritmo de crescimento da economia, porque encarecem o crédito para as famílias e os investimentos para as companhias. Nessa toada, o Fundo Monetário Internacional (FMI) reduziu a previsão para o PIB mundial deste ano de 4,4% para 3,6%.

A comparação feita pela Tendências inclui países latino-americanos que despertaram algum interesse dos investidores nos últimos anos, mas que passaram por incertezas recentes, sobretudo com disputas políticas.

Em março, o Chile elegeu o jovem Gabriel Boric, ex-líder estudantil, e, na semana passada, os eleitores colombianos deram a vitória na disputa presidencial para Gustavo Petro, ex-guerrilheiro do grupo M-19.

"São países que passaram por questões internas, por eleições que geraram desconfiança nos investidores", diz Campos Neto.

Esse ambiente mais difícil se expressa também no comportamento das moedas – a saída de capital acompanha a piora na percepção de risco. Elas têm perdido valor frente ao dólar norte-americano diante do movimento dos investidores de buscar ativos mais seguros nos EUA com a alta dos juros. Em junho, o dólar já subiu 10,55% em relação ao real até a última sexta-feira.

“A inflação nos Estados Unidos tem sido mais alta (do que o esperado). O Fed aumentou os juros em 0,75 ponto percentual, o que acaba pesando sobre as moedas”, diz Marco Maciel, sócio e economista da Kairós Capital.

Por que o Brasil sofre mais?

Na leitura de Maciel, o Brasil lida com o "mal de liquidez", ou seja, por ser uma grande economia, tem mais entrada e saída de recursos quando comparado com outros países, o que provoca a oscilação da moeda e do risco-país. Dessa forma, a economia brasileira sente mais as mudanças de cenário global.

"A alta de juros lá fora responde por 65% do movimento de desvalorização recente do real", diz o sócio e economista da Kairós Capital.

O Brasil sofre ainda com incertezas internas que despertaram a preocupação recente dos investidores. As principais dúvidas são se o governo Jair Bolsonaro (PL) e o Congresso vão intervir na política de preços da Petrobras e qual será o custo fiscal para conter a alta dos preços dos combustíveis.

De olho na reeleição, a alta do preço da gasolina e do diesel se tornou um problema para Bolsonaro, que está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Desde 2019, quando assumiu, Bolsonaro já indicou quatro presidentes para a Petrobras – a última escolha foi a de Caio Paes de Andrade.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), chegou a debater alterações na lei das Estatais, também numa tentativa de controlar os preços dos combustíveis - a lei foi sancionada durante o governo de presidente Michel Temer e tem como um dos objetivos evitar que setores do Executivo e de partidos políticos interfiram na gestão das estatais.

O mercado também se debruça sobre qual pode ser o custo fiscal das medidas adotadas pelo governo federal para mitigar a alta dos combustíveis no custo de vida do brasileiro. O governo tem sinalizado com a criação de um "voucher caminhoneiro" e aumentos do vale-gás e do Auxílio Brasil.

"No caso do Brasil, os movimentos de junho incomodaram os mercados. Houve mobilização (do governo e Congresso) em torno do preço dos combustíveis, com movimentos forçados de troca no comando (da Petrobras) e possíveis mudanças na lei das Estatais", diz Campos Neto.

Na sua última ata, o Comitê de Política Monetária (Copom) reconheceu riscos para a economia diante da incerteza sobre o "arcabouço fiscal" e das políticas que estimulem a economia em ano eleitoral. O Banco Central sinalizou que deve manter os juros altos por mais tempo.