O comandante do 9º Batalhão de Ações Especiais de Polícia (Baep), tenente-coronel José Thomaz Costa Júnior, de São José do Rio Preto (SP), atacou publicamente uma jornalista e o jornal Diário da Região. Ele os responsabilizou pela repercussão nacional de um vídeo institucional divulgado pela própria Polícia Militar de São Paulo (PM-SP), em que policiais aparecem em frente a uma cruz em chamas, com o braço em riste. O conteúdo da cerimônia, divulgado em 15 de abril no Instagram oficial da unidade, foi interpretado por críticos como uma alusão a rituais neonazistas e da Ku Klux Klan.

Durante discurso na Câmara Municipal da cidade, na terça-feira (22), o oficial acusou a repórter de “irresponsável” e prometeu medidas judiciais. Sem citar nomes, ele fez menção direta a uma reportagem assinada por ela, publicada pelo Diário da Região.

“Manifesto meu repúdio pelo jornal Diário da Região, meu repúdio pela irresponsável repórter que eles colocam no seu quadro de colunistas. Irão pagar por isso”, declarou o tenente-coronel na tribuna.

A fala gerou forte reação de entidades de defesa do jornalismo. Nesta segunda-feira (28), o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo (SJSP) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) divulgaram nota conjunta em repúdio às declarações.

“O jornalismo praticado pelo Diário da Região foi ético e responsável, resultando em um texto correto, que narrou os fatos com rigor, contexto e objetividade”, afirmam as entidades, destacando que a reportagem citava uma investigação do Ministério Público e respeitava o contraditório.

Repercussão antecede matéria do jornal local

Apesar das críticas, a reportagem do Diário da Região não foi a primeira nem a única a divulgar o vídeo. Além da Fórum, que fez nota sobre o assunto na noite daquele mesmo dia, o portal Ponte Jornalismo publicou matéria sobre o caso às 17h04 do dia 15 de abril, seguida pelo site Metrópoles às 17h08. A reportagem do Diário foi ao ar às 17h47, já após a ampla circulação do conteúdo. Ainda assim, o comandante exibiu a matéria local em um telão na Câmara, atribuindo a ela a “repercussão negativa” do episódio.

Na sessão, Costa Júnior também reapresentou o vídeo da cerimônia, desta vez com narração, afirmando que a cruz em chamas simbolizava “a fé que nos guia na mais densa escuridão”. Segundo ele, o ritual tratava-se da entrega de braçais a novos integrantes do batalhão, sem qualquer conotação ideológica.

No entanto, quando o vídeo foi originalmente postado no Instagram do 9º Baep, não havia qualquer contextualização ou narração que esclarecesse seu simbolismo. A própria Polícia Militar, em nota enviada à imprensa, limitou-se a informar que instaurou um procedimento investigativo.

“A Polícia Militar é uma instituição legalista e repudia toda e qualquer manifestação de intolerância. A Corporação não compactua com desvios de conduta e reforça que qualquer manifestação que contrarie seus valores e princípios será rigorosamente apurada”, disse a PM em nota.

Discurso na Câmara e apoio de vereadores

Durante a sessão na Câmara, o tenente-coronel também exibiu uma charge crítica ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), associando-a à repercussão do vídeo. Embora a ilustração não tenha relação com a jornalista ou com o Diário da Região, o comandante sugeriu que a publicação teve motivação política.

“Eles queriam militância política. Isso é honesto? Isso não é honestidade de uma profissional de imprensa”, afirmou.

Ao final de sua fala, Costa Júnior foi aplaudido de pé por quase todos os vereadores presentes. A exceção foi o vereador João Paulo Rillo (PSOL), que criticou os ataques à jornalista e defendeu investigação sobre os símbolos usados na cerimônia.

“Ela não fez nada além da sua função de retratar aquilo que, de fato, é estranho. Não é desejável que uma entidade tão importante como a PM adote rituais com simbologia trocada”, disse Rillo.

Vários vereadores saíram em defesa do comandante, incluindo o presidente da Câmara, Luciano Julião (PL), que afirmou: “Hoje, o errado é certo e o certo passou a ser errado. Conta sempre com essa Câmara Municipal”.

SSP não se manifesta

A reportagem do portal Ponte Jornalismo procurou a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) para comentar a participação do tenente-coronel na sessão e os ataques à jornalista. Até a publicação desta reportagem, a SSP não havia se manifestado.

Veja o vídeo abaixo com a sessão da Câmara de São José do Rio Preto: