Segunda-feira, 16 de junho de 2025
informe o texto

Notícias | Jurídico

Se for dar anistia para ''Débora do Batom'', tem que dar para 30 mil mães encarceradas no Brasil

ENCARCERAMENTO FEMININO

28/03/2025 - 17:03 | Atualizada em 28/03/2025 - 17:34

Cícero Henrique

Se for dar anistia para ''Débora do Batom'', tem que dar para 30 mil mães encarceradas no Brasil

Foto: Reprodução

A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou nesta sexta-feira (28) favoravelmente à concessão de prisão domiciliar para Débora Rodrigues dos Santos, cabeleireira ré por ter participado dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

"Débora do batom”, como foi apelidada, foi flagrada pichando com batom vermelho a estátua “A Justiça”, de Alfredo Ceschiatti, localizada em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), e está atualmente presa preventivamente.

Embora tenha se oposto à soltura da ré, a PGR entende que, diante do encerramento das investigações da Polícia Federal e do fato de Débora ser mãe de filhos menores de 12 anos, a prisão domiciliar é uma medida adequada até a conclusão do julgamento.

Em depoimento, Débora reconheceu a ilegalidade do seu ato, afirmou ter “ferido” o Estado Democrático de Direito e pediu perdão. 

A PGR sustenta que ela participou ativamente da tentativa de golpe e que acampou em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília, na véspera da invasão — um dos locais que, segundo a Justiça, serviram de base para a mobilização de apoiadores da intervenção militar.

Divergência no STF sobre a pena

O julgamento do caso começou na semana passada na Primeira Turma do STF. O relator, ministro Alexandre de Moraes, votou por uma pena de 14 anos de prisão, sendo acompanhado pelo ministro Flávio Dino. 

No entanto, o ministro Luiz Fux pediu vista e indicou que revisará a dosimetria sugerida.

Débora responde por cinco crimes:

  • Abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
  •  
  • Golpe de Estado;
  •  
  • Dano qualificado;
  •  
  • Deterioração de patrimônio tombado;
  •  
  • Associação criminosa armada.


Ainda não há data para a retomada do julgamento.

Encarceramento feminino no Brasil: um panorama alarmante

A professora Elenira Vilela, do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), usou as redes sociais para propor uma reflexão sobre o caso de Débora Rodrigues e o de outras milhares de mulheres seguem invisíveis nas prisões do país — muitas delas grávidas, lactantes ou mães de crianças pequenas, presas por crimes não violentos e, muitas vezes, sem condenação.

Elenira comenta que a população carcerária feminina é de mais de 40 mil mulheres encarceradas no país. Dessas, cerca de 80% são mães. Muitas são presas grávidas. 

Estima-se que entre 900 e mil bebês estejam vivendo hoje em presídios brasileiros com suas mães. A separação precoce também é uma realidade: a maioria das crianças permanece até seis meses com a mãe e depois é entregue a algum familiar. O sistema não oferece suporte psicológico adequado, nem estrutura para que essas famílias reconstruam os vínculos mais básicos.

O STF já determinou que mulheres gestantes ou com filhos menores de 12 anos, e que respondam por crimes sem violência, tenham direito à prisão domiciliar. Na prática, essa decisão é ignorada com frequência. As exceções viram regra.

Elenira desenha o perfil das mulheres presas, que segue um padrão alarmante: negras, pobres, com baixa escolaridade e vítimas de estruturas patriarcais que as empurram para o crime. 

Quase sempre envolvidas com o tráfico de drogas por influência de companheiros ou familiares, essas mulheres raramente recebem visitas e muitas sequer foram condenadas. Ainda assim, são privadas da liberdade.

A prisão de uma mãe desestrutura lares inteiros. Em regiões periféricas e comunidades vulneráveis, até 90% das famílias são monoparentais femininas — compostas apenas por mulheres e crianças. 

A ausência da figura materna é devastadora para essas estruturas frágeis, e o Estado falha duplamente ao não garantir alternativas humanizadas ao encarceramento.

Elenira pondera que o caso de Débora Rodrigues tem sido usado para provocar comoção e levantar o debate sobre anistia. Mas é importante lembrar que 70% dos 497 condenados por participação nos ataques golpistas são homens. 

Encarceramento feminino em números

Para além do caso de Débora vários dados evidenciam a necessidade urgente de políticas públicas que considerem as especificidades de gênero no sistema prisional brasileiro para garantir os direitos das mulheres encarceradas e promover sua reintegração social.

1. World Female Imprisonment List (6ª edição, dezembro de 2024):

População carcerária feminina mundial: Mais de 733 mil mulheres e meninas estão detidas em instituições penais ao redor do mundo.

Ranking global: O Brasil ocupa a terceira posição em número absoluto de mulheres encarceradas, com 50.441 detentas, ficando atrás apenas dos Estados Unidos (aproximadamente 174.607) e da China (145.000).

Crescimento desde 2000: O número de mulheres e meninas presas no Brasil aumentou significativamente desde 2000, refletindo uma tendência global de crescimento no encarceramento feminino.

Leia aqui o relatório completo em inglês.

2. Relatório do Instituto AzMina:

Perfil socioeconômico:

62% das mulheres presas são negras (pretas ou pardas).

66% não concluíram o ensino fundamental.

59% têm até 29 anos.

Motivação para o crime:

56% das detentas foram condenadas por crimes relacionados ao tráfico de drogas, geralmente sem violência ou grave ameaça.

7 em cada 10 mulheres afirmam que ingressaram no crime influenciadas por seus companheiros.

Direitos das mães presas:

Apesar do Marco Legal da Primeira Infância (Lei n.º 13.257/2016) ampliar as possibilidades de prisão domiciliar para mães gestantes ou com filhos de até 12 anos, muitas mulheres ainda têm esse direito negado.

Pesquisas indicam que 30% das brasileiras que deveriam ter a prisão preventiva substituída pela domiciliar tiveram o direito negado, e 43% das que cumprem pena definitiva também não obtiveram esse benefício.

https://azmina.com.br/reportagens/mulheres-presas-de-humanas-a-numeros/?utm_source=chatgpt.com

 

 

Informe seu email e receba notícias!

Sitevip Internet