17/08/2020 - 08:31 | Atualizada em 17/08/2020 - 08:38
Mary Zaidan
Com aflição semelhante à dos que há três meses decretaram o enterro antecipado do governo Jair Bolsonaro, muitos passaram a considerar inevitável a reeleição do presidente diante dos resultados da pesquisa Datafolha. Faltando longos 25 meses para o pleito, os de agora, tal como os de lá, exageram na miragem apocalíptica.
Alavancado pelo auxílio emergencial e por um providencial silêncio, Bolsonaro viu sua aprovação crescer de 32% para 37% em 50 dias e sua rejeição despencar 10 pontos percentuais. Ainda assim, continua altíssima – 34% – para um presidente com pouco mais de 18 meses de mandato. Perde feio para os três antecessores que se reelegeram quando comparado à aprovação de Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff no exercício do segundo ano de seus primeiros mandatos.
O pico registrado agora ainda não é capaz de esconder o derretimento do cacife de Bolsonaro, bastante acentuado quando os índices são cotejados com o resultado eleitoral. Está 9 pontos percentuais abaixo dos 46% que obteve no primeiro turno das eleições de 2018, etapa que mede o desejo do eleitor, e 18 pontos a menos dos 55% que o levaram ao Planalto.
Em setembro de 1996, FHC tinha aprovação de 47%. Foi o único eleito no primeiro turno, com 55%, 12 pontos acima da avaliação feita 19 meses depois. Lula era considerado ótimo ou bom por 45% em agosto de 2004 contra os 46% obtidos no primeiro turno de 2002 e Dilma alcançou 62% de aprovação, quase 10 pontos a mais dos 46,9% colhidos no primeiro turno de 2010. Pertenceu a FHC a mais alta rejeição registrada no segundo ano de mandato dos presidentes que se reelegeram, 25%, 9 pontos inferior à que Bolsonaro tem agora.
Apenas Fernando Collor de Mello, que congelou a poupança dos brasileiros, e Michel Temer, flagrado em conversas nada republicanas com o enroladíssimo Joesley Batista, exibiram performances piores.
Os 37% de ótimo/bom e a queda acentuada na rejeição são efeitos diretos da distribuição dos R$ 600 – e poucos se lembram de que a proposta original do governo era de R$ 200. Ainda que com índices positivos em todos os estratos de renda, o resultado final se deve majoritariamente aos mais pobres e com menor escolaridade. É a aprovação vinda da miséria, da fome.
Nessa seara, a pesquisa confirma o descalabro social brasileiro: 53% dos beneficiários usam o dinheiro do auxílio para comer, número que salta para 65% no Nordeste do país. Na região, antes dominada pelo PT de Lula, que fez cabresto com o Bolsa Família, a aprovação de Bolsonaro subiu 16 pontos, de 17% para 33%.
Mas emergência, como o nome diz, tem prazo. Sem ela, a aprovação despenca.
Para mantê-la, só estourando o teto ou criando novos impostos, alternativas complexas. A primeira, por justificar um processo de impeachment embasado nos mesmos fundamentos da cassação da ex-Dilma – com o voto do então deputado. A outra é rejeitada pela sociedade que já paga demais para receber quase nada em troca.
O crescimento na pesquisa chega a ser pífio diante do esforço abissal do presidente, em campanha 100% do tempo. Em todas as frentes: politização do auxílio emergencial, inaugurações de obras executadas (e até já inauguradas) por antecessores, cargos e poder para seus antigos pares, gente velhaca da velha política que ele sempre amou mas fingiu execrar para se eleger.
No vale tudo, Bolsonaro escancarou as porteiras para o fisiologismo, deu um pontapé no dito intocável Sérgio Moro e na Lava-Jato para cuidar dos rolos da sua família e satisfazer a sua “ilibadíssima” base de apoio no Congresso. Quando necessário, encena o liberal que nunca foi e faz de joão-bobo o seu ministro da Economia, outrora o Posto Ipiranga, balançando-o ora para dentro ora para fora do governo.
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