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Brasil está perdido porque quem produz tem de pedir permissão a quem nada produz

16/06/2019 - 08:19 | Atualizada em 16/06/2019 - 08:22

Irapuan Costa Junior

O filósofo Herbert Spencer, no livro “Primeiros Princípios”, logo no primeiro capítulo, fala da gênese relacional entre governo e indivíduo, tema que desenvolveu com mais profundidade em seu ensaio “O indivíduo contra o Estado”.

Discorre Spencer: “As tradições mais antigas representam os chefes como deuses ou semideuses… Naturalmente, a par dessas crenças, existiam outras, segundo as quais os chefes tinham sobre seus vassalos um poder ilimitado, um absoluto direito de propriedade, direito até sobre suas vidas… Em tempos e países menos bárbaros, encontramos essas crenças um pouco modificadas. Já não se considera o monarca como deus ou semideus, mas um homem que possui autoridade e talvez algo da natureza divina… em um período mais adiantado, como na Idade Média, na Europa, … a teoria da origem divina cede lugar à do direito divino. O rei não é um deus, nem um semideus, nem mesmo um descendente de Deus, mas um vigário de Deus… À medida que se desenvolve a opinião pública, o poder soberano se restringe; a crença no caráter sobrenatural do rei há muito foi afastada, e não deixou atrás de si mais que a opinião vulgar que atribui a ele uma bondade, uma sabedoria e uma beleza extraordinárias. A lealdade, que a princípio implicitamente significava submissão à vontade do chefe, não significa ou expressa hoje senão um tributo de subordinação e respeito… Obedecemos apenas às leis feitas pelos congressos; despojamos inteiramente os monarcas do poder legislativo e nos rebelaríamos contra seu exercício, se intentado por eles, mesmo em matéria de mínima importância. A doutrina primitiva está, pois, totalmente extinta em nossos tempos e países”.

Isto dizia o filósofo ao fim do século 19, espelhando os acontecimentos proporcionados pelo iluminismo, fenômeno marcante do século anterior, que tanto impacto teve sobre as sociedades europeias e mesmo sobre a nascente América do Norte. Spinoza, Locke, Montesquieu, Voltaire, Hume e outros influenciaram a Europa inteira e os Pais da Pátria norte-americanos, como Benjamin Franklin, Thomas Jefferson, Alexander Hamilton, e permitiram que os EUA tivessem, desde os primórdios, uma estrutura legislativa e administrativa verdadeiramente liberal, restringindo o poder do Estado e exaltando a liberdade do indivíduo.

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O governo “caçando” o cidadão para espoliá-lo | Foto: Reprodução

Spencer, falecido quando se abria o século 20, não veria o que se pode chamar de grande retrocesso, nessa relação comportamental entre o governo e o homem, tomado como indivíduo que pensa e que sente. Nazismo e comunismo reverteriam essa relação que vinha se aperfeiçoando através dos séculos, e voltariam a colocar o governo, personificado nos modernos reis, o Führer nazista e o secretário-geral do Partido Comunista, como novos deuses ou semideuses. Nem mesmo déspotas esclarecidos, como os produzidos pelo Iluminismo (dos quais o mais próximo de nós foi o português Marquês de Pombal), foram, como os tiranos “socialistas’’, tão senhores da vida e da morte dos governados.

O nazismo teve vida efêmera: apenas doze anos (1933-1945), mas o suficiente para mergulhar o mundo todo na mais devastadora das guerras. Já o comunismo beneficiado pelo auxílio dado (a contragosto) no extermínio nazista, tomou metade do globo, que asfixiou até quase o fim do século 20, desmoronou por pressão dos próprios governados, mas ainda resiste em algumas tristes nações e em várias atividades no chamado mundo democrático. Além de, aqui e ali, prometer sempre uma volta triunfal, religião que se tornou para seus seguidores. Todas as previsões otimistas de seus apóstolos Marx, Engels, Lênin, Trotski mostraram-se, em dezenas de experiências nos países mais variados, quer cultural, quer economicamente, desastradas, frustrantes, cruéis e desumanas.

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Antonio Gramsci: é impossível tornar real uma utopia | Foto: Reprodução

Mas o comunismo não desapareceu, como seu irmão, o nazismo. O comunismo, ao contrário do nazismo, teve o caráter internacionalista, o que lhe permitiu fincar raízes mundo afora, e que permanecem conduzindo sua seiva malfazeja. Além disso, colhe até hoje os benefícios do único filósofo deveras lúcido que produziu: Antônio Gramsci.

O italiano Gramsci (1891-1937) não consegue, como todos os filósofos comunistas, mostrar como chegar ao sucesso com essa doutrina, até porque é impossível tornar real uma utopia. Mas foi genial em apontar o caminho para a chegada do comunismo ao poder, embora o fracasso desse poder seja indesmentível. E é com base nos ensinamentos de Gramsci que a doutrina sobrevive até hoje, a despeito de seu comprovado fracasso. Mentes menos esclarecidas, por doutrinação ou por deficiência de discernimento, ainda julgam que vale a pena continuar tentando a implantação da crença, dado sua base de igualdade entre os homens como via para uma sociedade feliz. É característica da mente esquerdista uma certa alienação em que se troca o real, já muitas vezes provado, pela atratividade do sonho, sempre e apenas sonhado.

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Ayn Rand, filósofa: está perdido o país onde quem produz, para fazê-lo, tem que pedir permissão para quem nada produz | Foto: Reprodução

Em resumo: a evolução da relação entre governo e indivíduo não é contínua. Ao longo dos séculos, busca reduzir a opressão daquele sobre este, opressão sempre fácil, pois o governo tem a força. Mas este avanço não é contínuo, de maneira geral. Tem seus altos e baixos, suas idas e vindas, no tempo e no espaço geográfico. Mesmo nos países tidos como mais democráticos, essa relação entre governo e governado guarda suas distorções, se não nas relações comportamentais, pelo menos nas relações econômicas, que eram relativamente muito menos importantes à época de Spencer. A economia, quando viveu Spencer, apenas saía da Revolução Industrial, apenas engatinhava.

Hoje, existe uma nova opressão do governo sobre o governado: em qualquer país, uma carga tributária elevada significa um peso desnecessário sobre o setor produtivo, mas isto não é o pior: um baixo retorno dessa carga em serviços públicos significa que o governo está apenas alimentando a si mesmo. Apenas nas mais velhas e avançadas (em educação) sociedades, a presença do governo se restringe à Segurança, à Saúde Pública e à Educação Básica. Há uma tendência mundial na inflação das atividades governamentais, que se não contidas, incham a si próprias e avançam em setores que não lhe dizem respeito, o que se traduz em ineficiência, corrupção e assimetria na remuneração entre setor público e setor privado. Essa tendência é tanto maior quanto menos esclarecida a população com relação ao verdadeiro papel do governo.

O presidente americano Ronald Reagan dizia que governo não é solução, é problema. É nosso problema, aqui no Brasil, e precisamos reduzi-lo. Sobram exemplos.  Mesmo após os escândalos que abalaram a Petrobrás grande parte de nosso povo defende o monopólio estatal do petróleo, sem se aperceber dos abusos salariais que a companhia comete, e da sua ineficiência, que é paga por todo o povo brasileiro. O funcionário da Petrobrás ganha salários estratosféricos e produz três vezes menos que os funcionários de ume empresa privada, como a Exxon. Nós pagamos a conta, no preço de nossos combustíveis. Os salários do Judiciário, do Ministério Público e do Congresso são muitas vezes maiores que os de função assemelhada em qualquer indústria produtiva — e o setor público é cada vez, nos últimos trinta anos, mais improdutivo.

Nunca é demais repetir a filósofa judio-russa-americana Ayn Rand: está perdido o país onde quem produz, para fazê-lo, tem que pedir permissão para quem nada produz. O que diria Ayn Rand de um país onde quem produz, para fazê-lo, tem que pedir permissão a alguém que nada produz, e além disso é prepotente, demora nas decisões, recebe salário elevadíssimo e cobra taxas astronômicas?

 

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