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Omissão das testemunhas do mensalão é carta na manga para denúncias de outros crimes

01/08/2012 - 09:55

Josie Jerônimo

Brasília – A primeira denúncia do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) sobre a existência de esquema de cooptação de parlamentares por auxiliares do governo abriu o leque de outros crimes, confirmados por 600 testemunhas ouvidas na investigação que deu origem à Ação Penal 470, que começará a ser julgada amanhã pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Levantamento do Estado de Minas – que reuniu trechos de depoimentos de testemunhas de defesa e acusação arroladas na ação – mostra que os relatos dão suporte para confirmar denúncias apontadas pelo presidente do PTB em pelo menos três delitos: formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e corrupção passiva. A exceção é o próprio crime levantado por Jefferson em 2005, a orquestração de delitos para montar fundo usado para pagar mesada a parlamentares que votassem de acordo com a vontade do governo, o mensalão.

Entre as mais de 600 pessoas ouvidas de 2006 a 2010 como testemunhas no processo, o ex-deputado é o único a relatar informações dos dois núcleos, chamados financeiro e político, do suposto esquema. O advogado do denunciante, Luiz Francisco Corrêa Barbosa, afirma que, apesar de ninguém mais falar de mensalão nas 50 mil páginas da AP 470, as testemunhas confirmam saques de recursos com origem não explicada. "Tem 600 testemunhas, mas ninguém relata isso. Ninguém foi perguntado sobre isso. A prova de acusação são os recebimentos. Não se sabe a natureza do pagamento, mas ninguém nega os recebimentos. Isso (o crime financeiro) ninguém prova com testemunhas. É importante relembrar que ele (Jefferson) não é acusado de mensalão. Ele seria a melhor testemunha de acusação que o Ministério Público poderia encontrar", resume Barbosa.

Dirigentes partidários, donos de posto de gasolina e carro de som, fornecedores de campanha. Esse é o perfil recorrente das testemunhas arroladas pelos réus do mensalão. Um correligionário de diretório do interior do Rio de Janeiro que depõe a favor do ex-deputado Carlos Rodrigues chegou a afirmar que dívidas de campanha tinham motivado ameaças de morte contra integrantes do comitê partidário.

Do lado do Ministério Público Federal, 41 testemunhas arroladas como acusação relatam informações que podem comprovar crimes do núcleo financeiro. Grande parte do rol de testemunhas é composta por ex-funcionários dos bancos e empresas enquadradas como supostos financiadoras do esquema. Os depoentes relatam movimentações financeiras de pessoas ligadas ao grupo do empresário Marcos Valério Fernandes, apontado como suposto operador do mensalão.

A estratégia dos advogados de defesa dos integrantes do núcleo político é fazer um mea culpa sobre utilização de recursos de origem não identificada para pagamento de gastos eleitorais e fugir das acusações de formação de quadrilha que poderiam classificar o crime como mensalão. A admissão dos pequenos crimes pelas testemunhas arroladas faz parte do artifício.

De acordo o jurista Victor Gabriel Rodriguez, professor de direito penal da USP Ribeirão Preto, em casos de crime financeiro o peso do elemento testemunhal é menor, mas ajuda a comprovar a natureza das operações financeiras. "Na prática, para um processo como esse, que envolve valores vultuosos e lavagem de dinheiro, os depoimentos são suficientes para relatar esse tipo de delito. O juiz observa o contexto, ele geralmente não faz perguntas que a pessoa não pode responder como: Existe mensalão? O depoente vai dizer que não. Mas ele vai ficar atento às contradições", explica.

O especialista em direito penal afirma que um quadro de "tolerância social à corrupção" prejudica a tomada de depoimentos que sejam diretos ao relatar esquemas de desvio de verbas em contextos políticos. "O problema da corrupção é que você não tem um vitimado e um interessado. Você não tem alguém que reclame, porque a vítima é coletiva. No crime de corrupção, por não tern uma vítima concreta é difícil ter alguém com vontade de relatar, pois todos os envolvidos lucram."

 

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